OS DESAFIOS DO SINAI

Por historiador Amarildo Salvador

O relevo do Monte Sinai é desértico com temperaturas que variam de 47º C durante ao dia à -9º C durante a noite, a vegetação característica da região não favorece a ocupação humana, no entanto algumas famílias de beduínos[1] ainda resistem na região, essas famílias vivem do comércio relacionado às peregrinações que ocorrem na Montanha de Deus.

 A água é um recurso precioso no deserto, água de poço é quase inexistente e as das chuvas são ainda mais raras, essas ocorrem pelo menos duas vezes ao ano, mas a sua presença quase não é percebida devido à rápida evaporação. Projetos urbanísticos do atual governo pretendem povoar a região após obras de irrigação que irão proporcionar o aumento das áreas cultiváveis.

A região da Península do Sinai fica localizada entre o continente africano e o asiático sendo o Egito considerado uma nação transcontinental, mas a maior parte da população se concentra as margens do Nilo e a maior parte do território localiza-se no continente africano, essa nação segundo a divisão geopolítica pertence à África. A característica do deserto é única: areia, pedra, um céu azul sem nuvem e o sol reluzente no firmamento fustigando o corpo humano que se desidrata rapidamente e um reflexo solar nas areias do deserto que prejudica irreversivelmente a visão.

A subida do monte é repleta de obstáculos e somente a certeza do encontro pessoal com Deus garante a força necessária para vencer os desafios. O ponto mais elevado a 2.215 metros acima do nível do mar é o objetivo da caminhada o mesmo ponto onde o profeta recebeu as leis de Deus, do alto a visão é de um mar de areia e a impressão é de causar surpresa, pois o deserto parece não ter fim e suas areias se perdem no horizonte.

Península do Sinai

Com uma história milenar a península é importante para o Egito desde a antiguidade, os faraós do passado glorioso, tinham percebido a grande importância estratégica que aquela região conferia ao império. Por aquelas terras as tropas de Ramsés II[2] cruzaram para combater os Hititas e segundo Paul Johnson provavelmente foi no reinado de Ramsés II, que os hebreus sofreram com os trabalhos forçados e iniciaram o Êxodo.

Com efeito, há muitas provas convincentes de que no período de opressão egípcia, que, por fim, levou os israelitas a revoltarem-se e a escapar, ocorreu nas proximidades do último quarto do século do segundo milênio a.C., e quase certamente no reino do famoso Ramsés II. (Paul Johnson, p.36)

 

RamsésII

 

O calor intenso e uma sede constante geraram uma das maiores crises que Moisés enfrentou ao atravessar o deserto, manter o suprimento de água para o povo que se rebelava acreditando que a morte era certa e que a melhor solução seria retornar para o Egito. Conforme as narrativas bíblicas, o líder dos hebreus encontra uma fonte de água no deserto, essa, no entanto, era salobra e a providência divina de um Deus que zelava por seu povo, agiu através do seu escolhido ao qual com uma vara tocou na fonte e esta se tornou agradável para o povo consumi-la.

A região está integralmente inserida no relato bíblico do Antigo Testamento onde segundo os registros, no Monte Sinai Deus entregou os Dez Mandamentos para Moisés, no centro-sul da Península do Sinai, Egito, local sagrado para as três religiões monoteístas: cristianismo, judaísmo e islamismo.

Monte Sinai

A história de Moisés segundo as escrituras inicia-se as margens do Nilo atravessando o deserto e as margens do Mar Vermelho,[3] onde o maior desafio da fé é colocado em questão, o povo de Israel o atravessa com tranqüilidade enquanto o exército do Faraó é consumido pelas águas. Sua importância religiosa atraiu peregrinos ao longo dos anos, um dos exemplos importantes foi a visita da Imperatriz Helena de Bizancio, mãe do imperador Contantino o Grande[4], no século IV, que fez ali contruir uma igreja, a Capela da Sarça Ardente, a exemplo da igreja também construída em Jerusalém o local  suposto do Santo Sepulcro, fortalecendo assim a posição do imperador Contantino diante da nova força que emergia, o Cristianismo.

No Sinai foi estabelecido pela igreja romana, uma comunidade monástica e monges prontos para proteger o santo local do ataque dos povos do deserto, hostis a nova religião que emergia do judaísmo, com a nova mensagem que Jesus trouxe ao mundo, o imperador, Justiniano [5] mandou construir uma muralha à volta da igreja, no ano 542 e atualmente o  Mosteiro Ortodoxo de Santa Catarina é tombado como Patrimônio da humanidade pela UNESCO.

Mosteiro de Santa Catarina

Após atravessar o deserto, o mar, Moisés chega a uma região hoje conhecida como o deserto do Sinai o calor de 37°C ao dia com a umidade do ar a 25%, aumentando ainda mais a sensação térmica de calor, dificultando a presença do povo naquela região inóspita. Ao sopé da Montanha de Deus existe uma plataforma que é capaz de comportar mais de 60.000 pessoas, é provável que neste local os israelitas tenham espero por Moisés com as Tábuas da Lei e onde fora erguido o primeiro Tabernáculo. Por quatro vezes Moisés subiu a presença do Senhor na última vez ele recebeu a Lei, esse tempo foi de quarenta dias e quarenta noites, tempo em que o povo de Israel se rendeu ao paganismo[6] provocando a ira de Deus que fora aplacada pelo profeta que intercedeu pelo povo escolhido.

A região através dos milênios foi dominada por vários povos: egípcios, ptolomeus, romanos, bizantinos, mulçumanos, britânicos, israelenses e atualmente voltou para o domínio egípcio após o acordo de paz de Campo David (26 de março de 1979) acordo esse que o Egito reconhecia a soberania do Estado de Israel, e os israelenses devolveriam a Península do Sinai ao domínio egípcio.

A geografia da região tem seus relevos diferenciados o clima desértico desfavorece as caminhadas durante o dia, sendo essas feitas geralmente durante a noite. O Monte Sinai é a montanha de Deus, um local de difícil acesso que exige do fiel uma força espiritual e humana fora do comum, precisavam então estar preparados para superar as dificuldades físicas, a caminhada exige para os bem preparados fisicamente pelo menos uma hora e meia de subida sendo essa feita no período noturno devido à dificuldade encontrada pelo calor escaldante durante o dia.

O período noturno oferece o frio do deserto e estar agasalhado é tão necessário quanto estar hidratado, o horário mais apreciado é o nascer do sol, sob o olhar atento dos fiéis a esfera solar desponta no horizonte do deserto causando a impressão da chama divina, estando apoiado sobre o Monte de granito vermelho.  A subida ao monte pode ser feita por dois caminhos: o original, que consiste numa subida de mais de 4.000 degraus, ou outro, já adaptado pelos beduínos, onde se caminha por 7 km, mais a subida final é de 750 degraus. Na parte inferior além da plataforma capaz de comportar o povo israelita, que esperava o retorno de Moisés que recebia as Tábuas da Lei, existe uma caverna onde o profeta Elias teria passado 40 dias e noites em comunhão com Deus. Os sábios e os escritores judeus se esforçaram para comprovar que Moisés não era uma figura sobre-humana, diferente das outras culturas do mundo Antigo[7], esse fato ficou comprovado pelas escrituras que apresentam um homem com fraquezas humanas.

Podemos concluir que o Monte Sinai é um Monte separado para sagrado, o local onde a justiça se manifestou, já que foi lá que Deus deu um código jurídico e de ética, para o seu povo. Um lugar inóspito, sem vida, mas a partir deste Monte é que foi legitimada a nação dos israelitas, o começo da apropriação da terra prometida, e onde se consolidou a aliança entre o povo e seu Deus único.

[1] Beduínos (“que vive no deserto”) constituem um grupo nômade e vivem nos desertos do Oriente Médio e do norte da África.

[2] Ramsés II foi o terceiro faraó da XIX dinastia egípcia, uma das dinastias que compõem o Império Novo. Reinou entre aproximadamente 1279 a.C. e 1213 a.C. O seu reinado foi possivelmente o mais prestigioso da história egípcia tanto no aspecto econômico, administrativo, cultural e militar.Algumas fontes relatam ser esse o farao do Êxodo dos judeus.

[3] Também conhecido como mar dos juncos.

[4]  Constantino I, também conhecido como Constantino Magno ou Constantino, o Grande ( Naissus, 272 – 22 de maio de 337), foi um imperador romano,  proclamado  Augusto pelas suas tropas em 25 de julho  de 306 e governou uma porção crescente do Império Romano até a sua morte.22 de maio 337 oficializou o cristianismo.

[5] Flávio Pedro Sabácio Justiniano( Taurésio – 11 de maio de 483; Constantinopla  – 13 ou 14 de novembro de 565), conhecido simplesmente como Justiniano I ou Justiniano, o Grande, foi imperador bizantino desde  1 de agosto de 527até à sua morte.14 de novembro 565.

[6] O povo israelita estava no Egito, a algumas gerações, e o Egito cultuava a diversos deuses.

[7] Culturas mitológicas de semideuses.

Referências Bibliográficas:

Andrade, Claudionor. Geografia Bíblica. CPAD, 2008.

Gunneweg, Antonius H.J. História de Israel: Dos primórdios até Bar Kochba e de Theodor Herzl até os nosso dias.  Teológica 2005.

Josefo, Flávio. A História dos Hebreus. São Paulo: CPAD, 2001.

Johnson, Paul. História dos Judeus. Rio de Janeiro: Imago, 1995.

Lawrence, Paul. Livro Atlas Histórico e Geográfico da Bíblia. São Paulo: SBB. 

Iconografia:

Figura 1: egito-turismo.com

Figura 2: historianinresidence.com

Figura 3: panoramio.com

Figura 4: panoramio.com

Amarildo Salvador é historiador, membro do Centro de Pesquisas da Antiguidade (CPA/RJ)  do  Centro Cultural Jerusalém (CCJ).

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